Oficinas de Exploração Laboral – Sweatshops a “Melhor Alternativa Disponível”? Mas Quem Decide Que Alternativas estão Disponíveis?

The following article is translated into Portuguese from the English original, written by Kevin Carson.

De todos os comentários pretensamente libertários que tentam colocar a tragédia das confecções de peças de vestuário de Bangladesh em “perspectiva,” o de Benjamin Powell é provavelmente o pior (“Sweatshops Em Bangladesh Melhoram A Vida De Seus Trabalhadores, E Estimulam Crescimento,” Forbes, 2 de maio). Em Bangladesh, escreve Powell,

“cerca de 4.500 confecções empregam aproximadamente 4 milhões de trabalhadores. Levando-se em consideração todos os aspectos, eles ficam em melhor situação com as confecções do que ficariam sem elas; os benefícios superam os riscos. Na verdade, em comparação com outras oportunidades em Bangladesh, a indústria de peças de vestuário paga razoavelmente bem.”

Se empresas dos Estados Unidos como a Nike reduzissem sua presença em Bangladesh e abandonassem confecções lá por temor de má publicidade, “centenas de milhares de trabalhadores em peças de vestuário poderiam perder seus empregos e ser lançados em alternativas piores.”

Bem, é mesmo — sob certo aspecto. Quando um assaltante diz “seu dinheiro ou sua vida,” fico em melhor situação entregando o dinheiro e permanecendo vivo — mas foi o sujeito com a arma de fogo que estabeleceu artificialmente o leque de alternativas. A pergunta que você se deveria fazer, e que pessoas como Powell e o pessoal de nível de chefia da Nike não querem que você faça, é: quem decide quais outras alternativas estão disponíveis em Bangladesh?

Não se passa que algum fato da natureza, sem face, inevitável, seja forçado sobre as sweatshops — ou sobre a Nike — por algum mercado anônimo. Graças à marca registrada e à lei de patentes internacionais, a Nike e umas poucas outras empresas são as únicas opções disponíveis quando se trata de empregar pessoas para fazer sapatos. Elas podem aceitar o preço da Nike ou rejeitá-lo. Há porém muitas sweatshops competindo umas com as outras, e a Nike pode facilmente fazer negócio com outras delas. O poder oligopsônico de preços da Nike significa que a empresa pode estabelecer o preço que paga a uma sweatshop por um par de tênis tão baixo quanto desejar. E a mesma “propriedade intelectual” dá a ela poder de preço de oligopólio nos Estados Unidos para vender os tênis com preço de varejo milhares de por cento acima do custo real de produção. A margem entre o que ela paga às sweatshops pelos sapatos e o quanto ela extorque dos consumidores ocidentais não é estabelecida pelo “mercado.” É estabelecida pela Nike. Ela pode estabelecer essa margem tão alto ou tão baixo quanto desejar.

E a expressão decisiva aqui é “tão alto.” A Nike preferirá maximizar a margem que ganha em seus tênis, mesmo à custa de pessoas que residem em habitações locupletadas e trabalham centenas de horas por semana por poucos dólares por dia — e por vezes têm morte lenta e horrível às centenas nos escombros de suas confecções.

A chamada “propriedade intelectual” não é propriedade legítima, e sim monopólio imposto pelo estado, exatamente tão protecionista quanto as tarifas industriais de há um século. Do mesmo modo que a tarifa, a “propriedade intelectual” cria escassez artificial em bens que não são escassos por natureza, permitindo que corporações privilegiadas extraiam rentismo dessa escassez. As corporações globais do século 21 são tão dependentes da “propriedade intelectual” para seus lucros quanto as antigas corporações industriais nacionais do início do século 20 o eram das tarifas. As tarifas pararam de ser úteis à grande empresa, e a “propriedade intelectual” tornou-se útil, porque as corporações se tornaram globais. Pelo fato de o “comércio internacional” em realidade consistir em sua maior parte de transferência interna de bens entre subsidiárias locais de corporações globais, as tarifas não mais servem aos interesses das corporações gigantes. Do mesmo modo que a tarifa, a “propriedade intelectual” é uma restrição governamental acerca de quem tem licença para vender dado tipo de bem em dado mercado, permitindo ao beneficiário cobrar o que quer que os consumidores possam pagar. Diferentemente da tarifa, contudo, que era uma forma de protecionismo que regulava a transferência de bens através de fronteiras nacionais, a “propriedade intelectual” regula a transferência de bens através de fronteiras corporativas.

Diferentemente das corporações industriais de há cem anos, empresas como a Nike na verdade não fazem coisas. Elas usam direitos artificiais de propriedade tais como a “propriedade intelectual” para controlar as condições sob as quais outras pessoas podem fazer coisas, e para criar postos de pedágio entre as pessoas que fazem as coisas e as pessoas que consomem as coisas. O dinheiro realmente, realmente grande não está na capacidade de produzir, e sim na capacidade de coletar tributo para permitir que a produção aconteça.

Sem a “propriedade intelectual,” aquelas confecções em Bangladesh poderiam ignorar a marca registrada Nike e comerciar calçados idênticos com a população local por minúscula fração do preço. E sem a Nike para impor preços uniformes em toda a indústria, elas teriam de competir por trabalhadores locais. Não haveria problema nenhum se a Nike resolvesse “diminuir sua presença” e sair de Bangladesh. O meio de vida dos trabalhadores não mais seria mantido refém do que a Nike fizesse ou deixasse de fazer.

Artigo original afixado por Kevin Carson em 20 de maio de 2013.

Traduzido do inglês por Murilo Otávio Rodrigues Paes Leme.

 

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