The following article is translated into Portuguese from the English original, written by Kevin Carson.
Embora pessoas como Bill O’Reilly habitualmente refiram-se aos liberais do establishment como a “extrema Esquerda,” trata-se de duas coisas muito diferentes.
O que identificamos como liberalismo do Novo Pacto de meado século 20 tem suas raízes no Progressismo da virada do século 20. Os Progressistas eram principalmente oriundos das classes gerenciais-profissionais de colarinho branco que controlavam as grandes organizações burocráticas — corporações gigantes, órgãos do governo, universidades, fundações e institutos de pesquisa interdisciplinar — que dominaram a sociedade estadunidense depois da Guerra Civil. Muitos Progressistas do mundo corporativo tinham formação em engenharia indutrial. Os tipos de pessoas que formavam a base demográfica do Progressismo viam a sociedade estadunidense como extensão das grandes instituições hierárquicas que geriam, e achavam que a sociedade podia ser gerida do mesmo modo que um engenheiro geria processos industriais.
Nutro grande afeição pela Esquerda, e considero-me parte dela. Pelo liberalismo só sinto desprezo. Para ilustrar a distinção, Woodrow Wilson — bom liberal — praticamente liquidou com a genuína Esquerda Estadunidense durante e depois da Primeira Guerra Mundial.
Karl Hess, em A Maior Parte do Tempo na Margem, prezava-se de, embora ter ocupado posições no espectro político que foram desde isolacionista da Antiga Direita a Trabalhador Industrial do Mundo da Nova Esquerda, poder dizer verazmente nunca ter sido, na vida, um liberal.
Falando dos tipos de pessoas que leem The Nation e Mother Jones — pessoas que vejo como liberais — Alexander Cockburn (o tipo de Esquerdista que apoiava o direito a armas de fogo e odiava nazistas da dieta como Michael Bloomberg e Meme Roth) disse que tentar levar a Esquerda convencional a aceitar novas ideias era “algo assim como chegar a uma cidadezinha no ano de 1348 com escritas no rosto as palavras ‘Deixe-me entrar.’”
Pessoas como Rachel Maddow, de pé diante da Represa Hoover e conclamando os Estados Unidos a de novo fazerem “grandes coisas,” e Michael Moore, conclamando Detroit para que produzisse carros e ônibus elétricos, regridem ao coração das trevas da produção em massa do liberalismo de meado século 20. Até o Partido Verde foi praticamente sequestrado pelo liberalismo este ano, com a “rede inteligente” e o “Novo Pacto Verde” de Jill Stein — traindo uma fé galbraithiana quase religiosa em economias de escala ilimitadas e nas virtudes do centralismo burocrático.
Pior de tudo, porém, é a polícia do pensamento liberal profissional que instintivamente denuncia qualquer forma de horizontalismo ou descentralismo como “direita.” Thomas Frank, obviamente, vem fazendo isso há anos. Em recente troca de mensagens comigo no Twitter, Doug Henwood, editor da Left Business Review, essencialmente expressou as ideias de Frank ao desqualificar os movimentos P2P e Cultura Livre como retorno ao entusiasmo Dotcom da era Web 1.0 dos anos 1990. Isso mesmo: Henwood, numa exibição de desmazelo intelectual que deixaria orgulhoso Robert Welch, identificou Richard Stallman e Linus Torvalds com Bill Gates por causa de similaridade superficial na retórica deles.
Ultimamente tem havido uma cepa caseira de liberais que considera qualquer tendência descentralista ou horizontalista de que não gostem como um cavalo de Troia da Direita. Mark Ames e Yasha Levine têm repetidamente escrito artigos para The Nation desqualificando a reação organizada contra o invasivo regime apalpar-ou-espiar de “segurança” de aeroportos da Administração de Segurança dos Transportes – TSA como sendo uma espécie de iniciativa direitista mascarada de iniciativa popular dos Irmãos Koch.
E o Centro Sulista de Assistência Jurídica aos Pobres – SPLC vem incluindo anarcocapitalistas e voluntaristas em sua grande e amorfa lista de “extremistas” (também chamada de “coisas das quais não gostamos”). Minha amiga Katherine Gallagher (Twitter: @zhinxy) compara-o aos profissionais itinerantes que costumavam deleitar plateias protestantes cheias de curiosidade com historinhas prurientes acerca dos papistas, tais como túneis secretos entre mosteiros e conventos e sepulturas secretas cheias de esqueletos de crianças.
Pois bem, como anarquista de mercado esquerdista — ou socialista libertário de mercado — na tradição de Benjamin Tucker, percebo a maioria dos anarcocapitalistas desagradavelmente direitistas e dados a apologética pró-corporativa. Sem embargo, a sugestão de que a ideologia de David Friedman ou Murray Rothbard tenha o mesmo código de endereçamento postal da Milícia Hutaree é essencialmente um atestado de que quem diz isso é extremamente néscio.
E entendam isto: Os profissionais itinerantes do SPLC identificam, como sinal de “extremismo” de alguns anarcocapitalistas, o fato de eles considerarem a vitória Federalista como tendo sido um golpe. Ora bem, já li toda uma leva de historiadores revisionistas, de Charles Beard a Merrill Jensen a Howard Zinn, que descrevem a política dos anos 1780 como guerra de classes na qual os interesses plutocráticos triunfaram com a ratificação da Constituição. Nunca havia percebido que essas pessoas eram “direitistas.”
Minha impressão é a de que pessoas como Ames, Levine e Mark Potok desqualificariam Ivan Illich e Paul Goodman como “direitistas” por terem atacado a “educação pública.” Elas colocariam Huey Newton e Robert Williams na mesma categoria de Wayne LaPierre por eles terem considerado armas de fogo privadas defesa contra a opressão.
Trata-se de concentração de estupidez pura, densa a ponto de criar seu próprio horizonte de eventos.
Eis porque — esquerdista radical, se já existiu algum — não gosto de liberais.
Artigo original afixado por Kevin Carson em 21 de dezembro de 2012.
Traduzido do inglês por Murilo Otávio Rodrigues Paes Leme.