The following study is translated into Portuguese from the English original, written by Kevin Carson.
1. A Economia de Produção de Desperdício
2. Desperdício por causa de Rents de Escassez Artificial
3. Desperdício Decorrente de Trabalho de Guarda
Murray Bookchin argumentou, na Introdução a Anarquismo Pós-Escassez, que a administração da escassez, o controle do acesso a recursos escassos, foi a “base histórica” da maior parte das formas de hierarquia e autoritarismo. [39]
Isso realmente salta à vista. A maior parte das instituições de nossa sociedade, e a maior parte dos cargos de autoridade dentro da hierarquia delas, em última análise obtêm seu poder da ameaça “Faça como eu digo se quiser comer e ter teto.”
Além disso, o poder das hierarquias resulta do fato de o exercício do poder ser a ocupação principal (e amiúde também passatempo) daqueles que as operam, enquanto as pessoas de fora só podem participar da tomada de decisão durante o pouco tempo que conseguirem extrair de seu limitado lazer depois de trabalhar em seus empregos e cuidar das preocupações de família e da recreação. A escassez comparativa implica em maior quantidade de tempo de trabalho necessário para suprir as necessidades da vida, e numa resultante mudança na vantagem comparativa em favor daqueles que administram as hierarquias no tocante a tempo, energia e atenção para tomar decisões acerca de como as coisas podem ser feitas. Na França Revolucionária os Girondinos tentaram
reduzir o fervor revolucionário das assembléias populares parisienses — as grandes secções 1793 — mediante decretar que as reuniões deveriam terminar “às dez da noite” ou, como Carlyle nos conta, “antes de as pessoas que trabalhavam pudessem estar de volta…” de seu trabalho. [40]
Que interesse teria para David Rockefeller ou Bill Gates um mundo onde todo mundo tivesse um replicador de matéria-energia barato da Jornada nas Estrelas que pudesse oferecer a todos padrão de vida ilimitado — e onde esse padrão de vida estivesse ao alcance de todo mundo sem impedimentos, sem dependência de quem quer que fosse? A maior parte das instituições hierárquicas de nosso mundo, e as pessoas que as gerem, só existem para distribuir rações de bens escassos. A gerência de nosso local de trabalho e o sentido de identidade que ela obtém de sua função giram inteiramente em torno do fato da escassez e de nossa dependência em relação a citada gerência para podermos continuar a pagar o aluguel e a conta da mercearia. Num mundo onde não mais obtivesse status advindo de controle do sustento de outras pessoas, ela seria formada de estranhos numa terra estranha. Um mundo no qual todas as instituições hierárquicas no passado necessárias para regular a escassez se tornassem redundantes e irrelevantes— onde cada pessoa fosse uma igual de Gates e Rockefeller em riqueza e poder, e pudesse impunemente mandá-los para o inferno — seria intolerável para ela. Que graça teria viver como rei, se todo mundo fosse rei?
Mais ainda, a maioria dos recursos despendidos por estruturas autoritárias vai para os custos de fazer cumprir direitos de propriedade de recursos escassos. Quando essa escassez é natural, os custos de tornar efetivo o sistema de propriedade podem ser racionais. Quando, por exemplo, é necessário esforço significativo para criar bens materiais, e o esforço comparativo de produzir em comparação com furtar torna o furto alternativa atraente, os custos de proteger a posse, pelo produtor, do produto de seu trabalho contra furto poderá ser imprescindível.
Quando, porém, a escassez é artificial, o custo de torná-la efetiva representa perda cabal para sociedade. Quando a intervenção do estado aumenta artificialmente o esforço ou o desembolso de capital implicado na produção de dada unidade de bens de consumo, a facilidade comparativa de produzir sem níveis artificiais de esforço poderá tornar o esforço de contornar tais restrições proposta atraente. Por exemplo, quando o custo marginal de reproduzir informação digital é zero e o preço da informação digital obtida do “dono” satisfeito é significativo, a diferença de custo só poderá ser mantida por uma estrutura dispendiosa como a Lei dos Direitos Autorais do Milênio Digital e todo o maquinário da indústria e do Departamento de Justiça necessário para fazê-la cumprir.
Experimentamos grande mudança, em décadas recentes, de uma situação na qual a maior parte da escassez era natural para uma na qual a maior parte da escassez é artificial. Isso não quer dizer que os direitos de propriedade de bens escassos não fossem, na maioria dos casos, artificiais, mas simplesmente que tais bens eram realmente escassos no sentido de requererem esforço significativo para serem produzidos. O principal efeito dos direitos artificiais de propriedade, no tempo antigo, era o de deslocar o esforço indispensável de produção para outra pessoa que não o beneficiário. Nos dias de hoje, o principal efeito dos direitos artificiais de propriedade é, pelo contrário, na maioria dos casos, impor esforço onde não há razão material para esforço da parte deninguém, de tal maneira que os privilegiados possam coletar rents do esforço artificialmente imposto. O foco principal do socialismo no século dezenove foi assegurar que o esforço requerido para produzir bens de consumo fosse alocado equitativamente, e que o produto fosse distribuído proporcionalmente às contribuições ao processo de produção. Hoje, em contraste, nosso foco deveria ser em assegurar que não haja limites à livre reprodução de bens não escassos e não haja esforço requerido para consumo onde ele por natureza não exista. Crescente parcela do total de bens de consumo consiste no que Carl Menger chamou de “bens não econômicos,” cujo preço natural de mercado fora os rents de escassez artificial é zero. Nas palavras de Bookchin: “Há um século, a escassez tinha que ser tolerada; hoje, ela tem de ser feita cumprir — daí a importância do estado na era presente.” [41]
Samuel Bowles e Arjun Jayadev cunharam a expressão “trabalho de guarda” para atividade econômica cujo propósito precípuo é “a perpetuação de relações sociais de dominação e subordinação” — o que vimos Edward Wolff descrever acima como atividade econômica visante a assegurar o controle, por uma classe improdutiva, da produção excedente. Eles argumentaram que quanto maior o grau de desigualdade de riqueza e poder, maior a parcela de atividade econômica correspondente a trabalho de guarda. [42]
Douglas Dowd destacou a produtividade mais baixa de trabalho e custos unitários mais altos resultantes de baixo moral e outros problemas de incentivo na empresa capitalista padrão. [43] Por exemplo, as cooperativas de compensado de propriedade de trabalhadores do Noroeste do Pacífico normalmente têm um quarto do pessoal de supervisão de uma fábrica de compensado de propriedade capitalista, devido à estrutura de incentivos completamente diferente numa firma de propriedade e gerência de trabalhadores. Dowd comparou os 10.8% da força de trabalho dos Estados Unidos em cargos de gerência e de escritório em 1980, comparados com 3% na Alemanha e 4,4% no Japão.
Essa cifra de 1980 era relativamente modesta em comparação com o nível inflado que atingiu desde então. A expansão da gerência, tanto em número quanto em salários, como parcela da força de trabalho dos anos 1970 aos 1990, como descrito por David M. Gordon em Gordo e Sovina, confirma a tese de Bowles e Jayadev de uma correlação entre desigualdade econômica e trabalho de guarda. Os salários reais do trabalho não-supervisório têm permanecido, em grande parte, estagnados desde o final dos anos 1960, enquanto a produtividade real aumentou enormemente.
Entre 1973 e 1993 a parcela da remuneração total do trabalho destinada a gerência subiu de 28,6% para 41,1%. A diferença teria sido suficiente para aumentar o salário dos trabalhadores de produção em quase um quarto. E a parcela da força de trabalho não agrícola em posições de gerência subira para 13% na ocasião em que Gordon escreveu, em comparação com 4,2% no Japão. [44] Assim, pois, parece haver forte correlação entre gasto total em salários de gerência e o grau de desigualdade, tanto considerados outros países quanto ao longo do tempo nos Estados Unidos. Gordon extraiu explicitamente a correlação:
Em uma direção, salários estagnados ou cadentes criam necessidade de supervisão gerencial intensa dos empregados de linha de frente. Se os trabalhadores não compartilham dos frutos da empresa, se não contam com a promessa de segurança no emprego e aumento seguro do salário, que incentivo terão para trabalhar tão tenazmente quanto seu chefe gostaria? Assim, pois, as corporações precisam monitorar o esforço dos trabalhadores e ser capazes de convincentemente ameaçar puni-los se não tiverem bom desempenho. As corporações precisam empunhar o Porrete. No final das contas, o porrete requererá milhões de brandidores de porrete. [45]
Com uma abordagem coercitiva, em contraste, provavelmente persistirá conflito muito mais fundamental entre proprietários e trabalhadores a propósito do esforço de trabalho. As corporações estão naturalmente interessadas em seus empregados trabalharem tão duramente quanto possível. Na ausência de sensíveis benefícios salariais e segurança no emprego, entretanto, o que proporcionará ao trabalhador incentivo para trabalhar sequer próximo de o quanto tenazmente a corporação desejaria?…
A solução para tais problemas motivacionais… é uma conjugação de supervisão intensa dos empregados e ameaça de demissão…. [46]
5. Desperdício Decorrente de Insumos Subsidiados
6. Desperdício Decorrente de Desembolsos Compulsórios de Capital e de Overhead
7. Sistemas de Contabilidade e Vitrines Quebradas
8. Desperdício Interno no Processo de Produção
9. Desperdício Externo Decorrente de Marketing e de Obsolescência Planejada
10. Setores Desperdiçadores da Economia
11. “Não Há Trabalho Bastante”
12. Conclusão
Estudo original publicado por Kevin Carson 29 de dezembro de 2010.
Traduzido do inglês por Murilo Otávio Rodrigues Paes Leme.