Por Kevin Carson. Artigo original: The Weird Correlation Between “Understanding Economics” and Payola, de 6 de outubro 2024. Traduzido para o português por Ruan L.
Desde antes de nascermos, os textos defensores da tese segundo a qual “o aumento do salário mínimo causa desemprego” vêm sendo o cigarro Hollywood diário nos sites propagandistas do libertarianismo de direita como, por exemplo, a Foundation for Economic Education. Como reitero cada vez que vejo um desses – mais de uma vez nos comentários escritos –, tais pessoas demonstram um défice na compreensão de conceitos básicos como ceteris paribus (“todas outras coisas constantes”). Um fator em particular que eles falham em reconhecer, durante suas generalizações sobre o salário e o desemprego, é a elasticidade da demanda. Os efeitos provenientes de salários mais altos, incidentes sobre o desemprego dependem do quão elástica (sensitiva ao preço) é a demanda por um bem ou serviço particular.
(Ele também arrumou um jeito de entrar neste ponto cansativo e sem significado: “em seu nível mais básico, os preços são determinados pela oferta e demanda”. Mas, como eu escrevo em qualquer outro lugar:
“O fato de que os preços são postos pela balança da oferta e da demanda é tão óbvio que quase chega a ser uma tautologia. Em qualquer mercado onde o processo de formação dos preços pode [NT: pode no sentido de permissibilidade; no original: is allowed] pode ocorrer sem interferência de price caps ou preços mínimos impostos por de fora do mercado, o preço final é posto pela balança entre a oferta e a demanda. Isso é verdade até mesmo nas situações nas quais estas são determinadas em si por um poder de classe …
O argumento assume que a oferta e a demanda são quantidades que surgem do nada, e que os valores relativos da oferta e da demanda não são determinados por relações de poder. Reitero: por definição todos os preços de mercados resultam da interação entre oferta e demanda. Agora, pergunte-se esta importante questão: quais fatores institucionais determinam as próprias oferta e demanda?”
Contudo, voltando ao assunto principal, é estranho como essas pessoas conseguem reconhecer que a inelasticidade da demanda é importante quando eles estão justificando os preços dos alimentos fast–food para a indústria; todavia, esquecem imediatamente disso quando reivindicam que salários mais altos resultariam em desemprego.
Vêm à minha mente duas piadas: a primeira, de Upton Sinclair, sobre a dificuldade de fazer alguém entender algo “quando seu salário depende de não entendê-lo” [no original: when his salary depends on not understanding it]. O segundo, de David Roth, de que o trabalho de pessoas como Tyler Cowen é aquele de “encontrar novas maneiras de dizer ‘na realidade, seu chefe está certo’” [no original: to find new ways to say ‘actually, your boss is right’].
Você pode ser tentado a suspeitar, baseando-se na diferença entre suas habilidades de notar as nuances de um caso e de outro, que eles são um bando de jumentos adaptam seu entendimento do que é “Economia” para o interesse de seus donos. Todavia, mesmo explicando algum casos como o de John Stossel, o pressuposto de uma má-fé não é necessário na maioria das vezes. Ao invés disso, é mais provável que seja o tipo de mecanismo de filtragem automática que Edward Herman e Noam Chomsky descreveram em Manufacturing Consent.
O mecanismo de filtro é construído dentro da missão de certas organizações como Foundation for Economic Education, Future of Freedom Foundation, e a Reason Foundation. A missão é defender os “princípios de livre mercado”, ou “um sistema de empresas livre”, ou algo assim – que se traduz, em termos operacionais, em defender a legitimidade da maioria das corporações e dos bilionários. Enfim, esse é o pessoal que paga seus salários. Isso quer dizer que, exceto no caso de “crony capitalism” ou “corporatism” [NT: não confundir com corporativism, pois o termo “corporativismo” é usado de maneira equívoca no Brasil para denotar dois conceitos diferentes] – que deve ser tido como atípico ao nosso sistema econômico ao todo e aos players dominantes – os comentários econômicos que eles publicam devem ser projetados para a defesa dos interesses do negócio contra as críticas da esquerda.
Segue-se que uma peça que justifique que os salários simplesmente refletem a produtividade marginal do trabalho, que argumente que um aumento no salário mínimo resultará em desemprego tem uma probabilidade muito alta de ser publicada. Todavia, um comentário no qual alguém levanta o dedo e diz: “não é tão simples quanto esses pontos sugerem”. Esse será menos que bem vindo. Por outro lado, um comentário explicando todas as maneiras as quais “culpar os preços aumenta o poder de mercado das corporações é simplista” terá destaque tal qual Miltimore na FEE.
Apesar de tudo, quando for ler um comentário econômico que defende o libertarianismo de direita, não o faça esperando uma nuance ou alguma complexidade enquanto essas não se adequarem ao interesse do capital. Sob o risco de misturar metáforas, whether the writer of a given article strains at a gnat or swallows a camel depends on whose ox is being gored.