Antes estavam a utilizar os registos de contra-manifestantes para animar a sua campanha “anti-antifa”, com pouco sucesso, influenciando os ingénuos e os mal informados. Agora, estão a tentar utilizar a informação obtida dos movimentos mais recentes anti-polícia do BLM e da auto-defesa comunitária com ainda menos sucesso, supõe-se que devido ao apelo massivo causado pela sua interseccionalidade. Caso a insurreição se foque demasiado num só tema – como o anti-racismo, então a direita alternativa sairia beneficiado por a esquerda concentrar a sua causa em campanhas monotemáticas.
Por exemplo, o anti-fascismo tem o problema de só ser apelativo para pessoas que tenham uma identidade política muito específica. A direita alternativa depende desta politização uma vez que o seu público não se importa com factos e fazer com que a esquerda os aborde, passo a passo e nos seus termos, acaba por lhes ser vantajoso. Campanhas interseccionais e multitemáticas têm a virtude de unir as massas contra um problema comum e na prática demonstram as contradições na ideologia e no raciocínio da direita alternativa.
Os movimentos de massas informam as pessoas de que foram enganadas pelas notícias falsas dos órgãos de comunicação social da direita alternativa, pois alertam as pessoas para as contradições existentes na sociedade. Realçando as condições causadas pelo actual sistema, principalmente sem qualquer regulação no decorrer do reinado de Trump, temos o benefício de não centrar a luta exclusivamente na questão da direita alternativa. Como estratégia, tal seria dar-lhes uma plataforma que presume uma igualdade em termos de legitimidade política.
Até mesmo a cultura do cancelamento (que é perfeitamente aceitável da perspectiva moral, dado ser importante denunciar e desafiar as narrativas com base em mentiras da direita alternativa), não deixa de ser um entrave como a maior parte das campanhas monotemáticas, quando comparadas com as campanhas multitemáticas e interseccionais que unem as massas. Estas últimas refinam também nas massas a noção de ameaça por parte do Estado, o qual detém a maior autoridade de opressão política em acção contra a maior parte das pessoas.
É importante compreender que a estratégia de reprodução cultural da direita alternativa depende desta conseguir realçar determinada identidade social ou política e depois a sujeitar às suas próprias auto-projecções, cujas formas mais lógicas de raciocínio determinariam ser contraintuitivas se não mesmo descaradamente discriminatórias. A direita alternativa diz que os anti-fascistas são fascistas por eles próprios serem fascistas. Afirma que o BLM é racista por eles próprios serem racistas. Surram a cultura do cancelamento, apesar de terem surgido e ganho notoriedade por denunciarem a esquerda. Dizem que a esquerda é constituída por flocos de neve sensíveis que precisam de espaços seguros, contudo normalmente são eles que se enfurecem e fazem queixinhas quando são denunciados – chamando e até dependendo da polícia para lhes criar espaços seguros quando os anti-fascistas se juntam para contra-manifestar nas suas marchas e comícios. Por outras palavras as campanhas de desinformação da direita alternativa dependem desta destacar uma identidade, valor ou crença e obrigar as tendências políticas rivais a entrarem no seu campo para lhe responderem.
Outro exemplo do seu modelo estratégico pode ser visto nas condutas culturais utilizadas pela direita alternativa. Em vez de alertar a direita libertária para os erros do seu raciocínio e lógica, tentativa frequente por parte da esquerda, a direita alternativa costuma alinhar e cultivar os seus preconceitos reforçando-os e validando-os. Quando as fontes noticiosas da direita alternativa não criam mentiras descaradas, têm o hábito de parcelar e apresentar determinados factos e dados de modo a que estes contornem a verdade. Esta estratégia levou a direita libertária a pensar do mesmo modo que a direita alternativa, atraindo muita gente da direita alternativa para o seu movimento – pressupondo que não lhe aderiram para se afirmar explicitamente como sendo da direita alternativa. Esta estratégia tem também como alvo o público em geral, ao ponto de vermos liberais (embora mais políticos como Joe Biden em vez de pessoas comuns da classe trabalhadora) a ecoar os apelos à perseguição aos anarquistas, que desfrutam da liberdade de pensamento da Primeira Emenda.
O BLM começou a ter um impacto maior na Primavera quando o seu direccionamento se focou na causa da auto-defesa comunitária e da abolição da polícia, que tem o amplo apelo interseccional e multitemático de ser anti-estatal, anti-racista, anti-sexista, anti-militarização da polícia, anti-violência policial, anti-encarceramentos em massa, etc. Tem a virtude de focar e minar a maior causa dos homicídios de negros nos EUA e conseguir levar a cabo protestos em massa.
Tal não significa que o BLM não se deva focar em todos os aspectos e nuances do racismo como ferramenta estrutural de opressão, ou que o anti-racismo e o anti-fascismo não têm só a ver com a denúncia e a refutação de narrativas preconceituosas, mas essas estratégias por si só 1) não são suficientes para convencer aqueles que desconhecem ou descartam os factos por tentarem bater-se no mesmo patamar que personagens que na realidade não se baseiam em factos, e 2) esquecem que movimentos unificados de massas afogam as tretas da direita alternativa com projectos e objectivos construtivos. Tal significa que não lhes damos espaço, o que mina qualquer plataforma que pudessem utilizar. E levanta questões que fazem com que as massas questionem e analizem de modo crítico a narrativa e a agenda política delineadas pela direita alternativa, aumentando assim a sua consciencialização. As denúncias, as contra-manifestações anti-fascistas, etc., não são más por si só, mas são uma medida de entrave que na realidade mantém a esquerda e a direita presas neste concurso subcultural de afrontamentos uma vez que a direita alternativa pode sempre armar-se em vítima e atrair pessoas em volta da sua vitimização quando não estão em jogo movimentos de massas. Travamos a direita alternativa ao assumir campanhas amplas interseccionais e multitemáticas que afastam as pessoas das suas distracções manipuladoras e odiosas.
O BLM só obteve um maior efeito quando se centrou na causa de cortar o financiamento à polícia pois tal tem um apelo amplo que envolve as massas no combate à principal causa de homicídios de negros nos EUA, i.e. pelas forças policiais. De igual modo, a causa da auto-defesa comunitária está a ter o efeito de unir as massas contra os fascistas isolados das ruas e contra o aparelho do Estado dos quais os fascistas se querem apropriar.
Por exemplo, ao contrário do que a direita alternativa quer que as pessoas acreditem, a identidade política é a identidade menos estável que estão a tentar oprimir e mesmo assim a esquerda actualmente aparenta ser o principal alvo desta. Tal ocorre porque a esquerda é um entrave ao seu domínio e opressão sobre os outros com base em raça, classe, género, identidade sexual, etc. Transmitem caricaturas falsas da agenda política, da ideologia e do carácter pessoal da esquerda. Quanto mais a esquerda os atacar directamente, mais se sujeita à estratégia da auto-vitimização da direita.
A direita alternativa – agora mais que antes – precisa da oposição anti-fascista como carne para canhão para produzir e distribuir a sua propaganda. A causa do policiamento comunitário pode servir o duplo propósito de resguardar a esquerda da direita alternativa ao mesmo tempo que cria a infra-estrutura social necessária para proteger as massas do Estado. Não me levem a mal, mas se a direita alternativa começar a construir o ambiente que resultou no tipo de protestos nacionais que decorreram entre 2017-2018 (anti-antifa, anti-lei da sharia, unir a direita, etc.) então os anti-fascistas terão toda a razão em centrar-se na acção directa, uma vez mais, mas na actual situação, medidas de auto-defesa comunitária mais amplas teriam um maior impacto contra a sua movimentação ao reduzir o poder do principal objectivo da direita alternativa: o aparato do Estado.