The following article is translated into Portuguese from the English original, written by Kevin Carson.
Observar duas intelectualmente deficientes bonecas Ken com “penteado tipo executivo” — Mitt Romney e Rick Perry — preparando-se para debater lembra-me o quanto sinto falta de Dan Quayle.
Por incrível que pareça, logo antes de eu ouvir falar da última mancada de Romney, estava lendo a respeito de um estudo do psicólogo Dacher Keltner. A experiência de vida dos ricos, diz ele, torna-os menos empáticos e mais egoístas do que as pessoas comuns. Parte disso é obtusidade deliberada; legitimar ideologias é algo que não apenas habitua os explorados a levar na cabeça como também permite que os exploradores durmam à noite dizendo para si próprios que os pobres realmente merecem.
Os ricos justificam suas relações com outras classes sociais com a ajuda da ideologia estadunidensista, por meio da qual exalçam a percepção de seu próprio entranhado individualismo e veem sua riqueza como resultado de caráter: “Eles acham que o sucesso econômico e resultados políticos, e resultados pessoais, têm a ver com comportamento individual, com uma boa ética de trabalho. …”(*) (* A Wikipedia explica que a ética de (ou do) trabalho não se confunde com ética de negócios e sim consiste num conjunto de valores baseado no trabalho árduo e na diligência. Exemplo, clássico aliás, seria a ética de trabalho protestante. Uma ética de trabalho incluiria ser pessoa de confiança, ter iniciativa, ou perseguir a aquisição de novas habilidades. A ética de trabalho, segundo alguns, não se limitaria ao trabalho árduo, mas também a virtudes pessoais daquele que trabalha arduamente, indispensáveis para o desenvolvimento e a sustentação de livres mercados. Ver Wikipedia, Work ethic.)
Em outras palavras, a ideologia espúria de “livre mercado” — por oposição à genuína — é o ópio das elites. Que as liberta da culpa pelo privilégio e torna sua existência suportável. A ideologia neoliberal — tal como aparece nos programas de locutores do CNBC, na página editorial do Wall Street Journal – WSJ, e nos artigos bajulatórios de FreedomWorks — defende o modelo existente de capitalismo corporativo e suas grandes concentrações de riqueza como se resultassem de virtude superior num mercado competitivo (“é assim que nosso sistema de livre mercado funciona”). Deliberadamente obscurece o papel fundamental da intervenção do governo — formas de escassez artificial, direitos artificiais de propriedade, subsídios — na atual distribuição de riqueza e de poder econômico.
De volta a Romney: Em resposta a um aparteador, ele replicou espirituosamente que “As corporações são pessoas. … Tudo o que as corporações ganham também vai para pessoas.” Diante das gargalhadas da plateia, ele perguntou “Para onde vocês pensam que vai?” “Para os bolsos deles!” retrucou o aparteador. “Bolsos de quem?” retornou Romney. “Para os bolsos de pessoas! Seres humanos, meu amigo.”
Isso é tecnicamente verdade, obviamente. O dinheiro que uma corporação ganha a expensas dos consumidores e dos trabalhadores por meio de trocas desiguais forçadas pelo estado é todo distribuído para pessoas.
Mas e daí? A menos que David Icke esteja certo e nós sejamos secretamente governados por lagartos alienígenasinvasores, todo sistema de exploração de classes da história humana serviu aos interesses de algum grupo de seres humanos. Em toda sociedade da história, não importa quão brutalmente exploradora, obviamente o ganho ilícito foi consumido por “pessoas.” Os patrícios romanos que viviam do suor dos escravos eram pessoas, e bem assim o eram os senhores feudais que extorquiam rents dos camponeses. Suspeito de terem sido “pessoas” — pessoas perversas — quem se aproveitou dos dentes de ouro extraídos em Auschwitz.
A questão é, que pessoas? Para quem a riqueza das corporações monopolistas flui desproporcionalmente? Para as mesmas pessoas para as quais foram os lucros do trabalho escravo e os rents do feudalismo, as pessoas descritas por Adam Smith: “Tudo para nós, e nada para outras pessoas, parece, em toda época do mundo, ter sido a vil máxima dos senhores do gênero humano.”
Felizmente para eles, os senhores têm a mitologia do “capitalismo de pessoas” — na qual os lucros corporativos vão todos para planos de aposentadoria pagos pelo empregador, para fundos de pensão e para a economia de posse de pessoas comuns que fazem day-trading na Internet — para assegurarem a si próprios não serem realmente lombrigas solitárias gigantes, em absoluto. Toda essa conversa acerca de injustiça e riqueza ganha sem trabalho é apenas “guerra de classes,” a “política da inveja.” Ou, como Romney desdenhou, “Houve uma época neste país quando não atacávamos as pessoas por causa do sucesso delas.”
O sucesso do próprio Romney merece alguma perscrutação. Ele está concorrendo como antigo Executivo Principal que — diferentemente de Obama — compreende “como a economia funciona.” Vejam, ele conhece em primeira mão as necessidades dos heroicos homens de negócios que “criam empregos.”
Em realidade, porém, Romney fez tudo usando o mesmo estoque de táticas/métodos de Mestre em Administração de Empresas que Chainsaw Al e Bob Nardelli: Eviscerar o capital humano, vender ativos da empresa em proveito pessoal, esvaziar a capacidade produtiva de longo prazo para inflar os números deste trimestre e fazer subir os preços das ações, em seguida garantir sua própria indenização por exoneração de executivo e emborcar a casca vazia em cima de outro comedor de carniça. Romney, como executivo, foi, para o enxugamento de pessoal [downsizing], o que Maria Tifoide foi para a tifoide.(*) (* Maria Tifoide foi a primeira pessoa nos Estados Unidos identificada como portadora assintomática do patógeno associado à febre tifoide. http://pt.wikipedia.org/wiki/Mary_Mallon)
É natural que Romney se agarre a qualquer pretexto para ver a si próprio como alguma coisa além de apenas outro paspalho da classe mais alta que por ocupar a terceira posição acha que conseguiu fazer um triplo(*). Graças ao evangelho de Sucesso, Realização e Prosperidade, os vis senhores do gênero humano podem continuar dizendo a si próprios que afinal não são parasitas; estão apenas tomando posse do que lhes é devido. (* Analogia com beisebol, esporte do qual não entendo.)
Artigo original afixado por Kevin Carson em 15 de agosto de 2011.
Traduzido do inglês por Murilo Otávio Rodrigues Paes Leme.