As discussões políticas nos Estados Unidos frequentemente deixam de perceber a diferença entre “pró-empresas” e “pró-mercado”. A incapacidade de observar as implicações dessa diferença leva os comentaristas políticos e os eleitores a acreditar que, se um candidato é pró-empresas, naturalmente deva ser um ardente defensor do mercado livre.
Ultimamente essa narrativa ultrasimplificada está sendo desafiada, uma vez que grupos empresariais como a Câmara de Comércio dos Estados Unidos cada vez mais apoiam democratas em vez de republicanos do Tea Party, que são percebidos como mais libertários que os republicanos tradicionais e assim mais dispostos a tomar medidas hostis aos grandes negócios.
Não importa quais sejam os ruídos populistas embutidos nos discursos de campanha, o fato mais óbvio é que ambos os grandes partidos americanos participam do mesmo jogo corporativo. Apesar dos argumentos contrários dos republocratas, no momento decisivo você não conseguirá encontrar um mísero defensor dos mais fracos entre os burocratas americanos. Pelo contrário, no final a discussão não é entre os grupos azuis e vermelhos — é entre o próprio processo político, o mecanismo da autoridade política, e o resto de nós, pessoas comuns e trabalhadoras que tentam pagar as contas.
Para vislumbrar o real relacionamento entre as grandes empresas e o estado, precisamos apenas examinar brevemente os dados sobre como os comitês de ação política (PACs) das maiores e mais influentes empresas do país gastam seu dinheiro. Considere alguns exemplos de 2010: naquele ano, o comitê da grande empresa de defesa Raytheon deu 56% de seu dinheiro para os democratas e 44% para os republicanos. A gigante aeroespacial Boeing dividiu suas doações quase ao meio, canalizando 53% delas para os democratas e 45% para os republicanos. A gigantesca firma do agronegócio Monsanto deu 46% do dinheiro de seu PAC para o Partido Democrata e 54% para o Republicano.
Essas divisões entre democratas e republicanos evidentemente variam a cada eleição, dependendo de fatores como a composição do Congresso e a probabilidade de vitória de cada um. E certamente diferenças marginais entre candidatos e partidos também pode se apresentar em dada eleição. O ponto aqui, porém, é que as entidades corporativas são como o próprio estado: não-partidárias, mas interessadas apenas em poder e engrandecimento próprio.
Não se engane, nossos leviatãs corporativos não se importam com os nomes que estão no poder, contanto que joguem de acordo com as regras, perpetuando um jogo venal de coesão pública-privada que nada tem a ver com a “liberdade e justiça para todos”. O que pensaríamos sobre um indivíduo que repartisse seu dinheiro quase igualmente entre os dois maiores candidatos ano após ano? Provavelmente que se trata de um louco ou alguém com múltiplas personalidades. Quando uma entidade corporativa o faz, contudo, nós consideramos sua ação (provavelmente de forma correta) como algo estritamente estratégico, uma ilustração da realpolitik e uma maneira com a qual as empresas contam para garantir boas relações com ambas as alas do establishment político.
Essa cumplicidade entre o poder corporativo e estatal não é necessariamente planejada ou premeditada, mas também não é acidental. Um sistema centralizado de política que dá poderes discrecionários e legislativos amplos a um pequeno grupo elitizado incentiva o abuso desses poderes em favor dos interesses dos endinheirados. Como o anarquista individualista William Bailie escreveu, “leis são feitas direta ou indiretamente de acordo com o interesse da classe capitalista e são sempre administradas e interpretadas (…) nesse espírito”.
Os anarquistas de mercado defendem um sistema econômico livre e justo em que os grandes negócios e o governo não trabalhem juntos para manipular as regras em prol dos poderosos e bem conectados. Consistentemente observadas, as liberdades de competição e trocas abalam o domínio das grandes empresas, que dependem atualmente do estado para possuírem seus muitos privilégios. Uma vez que nem republicanos nem democratas questionam as características fundamentais desse sistema estatal-corporativo, o caminho das mudanças reais não passa por nenhum deles.
Traduzido por Erick Vasconcelos.