The following article is translated into Portuguese from the English original, written by Kevin Carson.
O cerne de minha filosofia, como anarquista de mercado, é a crença segundo a qual a troca em condições de igualdade é mutuamente benéfica. A exploração econômica só pode resultar de troca em condições de desigualdade, o que requer interferência coercitiva no processo normal de trocas do mercado. Muitas pessoas têm dúvida quanto a isso. Assim, tomemos a argumentação que mostra por que as coisas se passam assim, e dividamo-la em passos simples.
A troca em condições de igualdade geralmente redunda em resultados igualitários porque os seres humanos são maximizadores de utilidade. Adam Smith argumentava que a troca de bens e serviços tende a ocorrer numa proporção que reflete o esforço para produzi-los. Se levar um dia de trabalho para apanhar em armadilha três castores ou caçar dois veados, o preço de mercado tenderá para equilíbro tal que três castores = dois veados. A razão é que, se os veados tiverem preço superior ao de três castores, tornar-se-á economicamente mais vantajoso caçar veados do que trocar castores por eles. O preço adicional dos veados em relação ao dos castores levará os trabalhadores, ao longo do tempo, a trocarem a montagem de armadilhas pela caça, o que fará o preço retroagir a seu nível natural.
Enquanto a competição for livre, as pessoas reagirão às trocas desiguais mediante procurarem termos de maior igualdade. E desde que não existam barreiras à entrada no mercado, os preços acima do custo de produção (incluindo a desutilidade do trabalho) representarão incentivo para entrar no mercado oferecendo preço inferior. Portanto, como argumentou Franz Oppenheimer, o mercado sempre tende para um equilíbrio no qual os bens são trocados numa proporção que reflete as desutilidades subjetivas dos produtores.
Essa é a tendência natural, a qual prevalece na medida em que os agentes em determinado mercado sejam iguais e o poder não entre na equação. O único modo de vender bens e serviços a preço superior ao custo da produção e da desutilidade subjetiva implicada na produção deles é usar a força para suprimir a competição de quem forneça mais barato.
Privilégio é o uso de força direta ou indireta para suprimir a competição, para controlar os termos segundo os quais as outras pessoas trabalham para obter bens de consumo, de tal maneira que essas outras pessoas tenham de trabalhar para sustentar o detentor do privilégio como condição para ser permitido a elas trabalhar para sustentarem a si próprias.
O que os estados fazem é garantir o privilégio. O exemplo clássico, que Oppenheimer explana em “O Estado,” é a propriedade artificial da terra. O trabalho assalariado com caráter de exploração torna-se impossível quando os empregadores estejam sujeitos a competição desimpedida por parte do autoemprego.
Em países predominantemente agrários isso significa, especificamente, que, desde que terra vaga convenientemente localizada esteja disponível para cultivo, a competição oriunda da produção agrícola de subsistência empurrará os salários para cima e puxará os lucros para baixo. Em países agrários, o estado age em conluio com senhorios e empregadores para apropriar-se da terra por meios políticos. A oligarquia fundiária usa títulos artificiais de propriedade tanto para vedar produtores em terras vagas quanto para extrair rentismo daqueles que sejam proprietários legítimos em virtude do cultivo.
O mesmo princípio básico aplica-se a todas as situações nas quais uma classe privilegiada interpõe-se entre produção e consumo, cobrando pedágio pelo direito de alguém transformar seu próprio trabalho em subsistência. Esse fenômeno toma a forma de direitos artificiais de propriedade tais como patente e copyright, de cartéis regulamentadores que restringem a competição de preços ou aumentam artificialmente os desembolsos de capital e as despesas gerais [overhead] exigidos para a produção, e de subsídios que ocultam preços de monopólio debaixo da fachada de cobrança de impostos.
Por exemplo, 95% ou mais do preço dos tênis da Nike, oriundos de sobrepreço por causa de nome de marca, constituem rentismo de propriedade artificial para a corporação Nike. O mesmo se dá no tocante ao enorme sobrepreço a título de “propriedade intelectual” de um CD do Windows ou do Office da Microsoft, ou de um medicamento patenteado. O mesmo ocorre com a maior parte dos preços de bens eletrônicos que resultam de rentismo embutido em patentes em vez de serem oriundos de peças e trabalho reais.
Como R.A. Wilson argumentou na trilogia Illuminatus!, sempre que você vir trocas resultando sistematicamente em ganho para uma parte e prejuízo para outra, pode saber que não se trata de intercâmbio de “livre mercado” coisa nenhuma. O jogo está viciado. Big Bill Haywood, um dos fundadores da Trabalhadores Industriais do Mundo – I.W.W., ou “Wobblies,” expressou-o do seguinte modo: “Para cada homem que ganha um dólar pelo qual não trabalhou há um homem que trabalhou por um dólar que não ganhou.”
Liberais supermães(*) gostam de falar de pessoas que “trabalham duro e pautam-se pelas regras,” mas não são bem-sucedidas. Qual é, cara-pálida! Alguém lá fica surpreso quando alguém obedece às regras, em Las Vegas, e a casa ganha? A despeito da retórica do “livre mercado” usada por nossa elite plutocrática de bilionários, banqueiros e 500 executivos principais da Fortune, o que temos não é um livre mercado. É um jogo de cartas marcadas no qual a casa sempre ganha. (*) Acerca da expressão soccer mom, ver, em espanhol, a Wikipedia, http://es.wikipedia.org/wiki/Soccer_mom
Artigo original afixado por Kevin Carson em 5 de junho de 2012.
Traduzido do inglês por Murilo Otávio Rodrigues Paes Leme.