O Canadá recentemente anunciou planos para abrigar 25 mil refugiados sírios o quanto antes. Contudo, nem todos os refugiados serão considerados. Homens adultos sem famílias serão excluídos. O Canadá acrescentou uma estipulação permitindo aos refugiados homens entrar no Canadá se forem gays. Homens gays e todas as outras minorias sexuais e de gênero enfrentam grandes riscos dentro do Oriente Médio, então a prioridade a elas faz sentido. Contudo, longe de ser um gesto de caridade e humanidade desta democracia ocidental, o plano ameaça os refugiados gays e submete suas identidades sexuais às vontades de uma burocracia. Os avaliadores dos refugiados estão bastante cientes desses fatos.
De acordo com um artigo publicado no National Post, os encarregados de avaliar os pedidos de asilo afirmaram que não temem declarações falsas. Mas mesmo as declarações são perigosas — pedir asilo como refugiado como homossexual pode assinar sua sentença de morte. Residindo em campos de refugiados “lotados, onde circula muita informação boca a boca”, os refugiados gays se expõem aos abusos e à violência tradicionalmente praticados por seus compatriotas.
Para serem reconhecidos como homens homossexuais pelos burocratas, é necessário atingir os critérios de um documento de 17 páginas das Nações Unidas emitido em 2012. Um refugiado deve divulgar informações aos interrogadores como quando ele descobriu que era gay, quais foram suas tentativas de se esconder e o abuso que sofreu. O primeiro problema é que isso pode forçar pessoas traumatizadas a reviver seus passados de tortura. Há grande vergonha e muitas cicatrizes emocionais entre as minorias sexuais oprimidas.
Contudo, um problema ainda mais pernicioso e sutil sublinha esse sistema de regulação sexual. Não apenas ele é cruel é desumano, mas ele também regula o que se define como experiência homossexual. Vemos nos padrões desses documentos um apego à vitimização como definidora da identidade sexual. Não ter as cicatrizes da opressão significa ser excluído da homossexualidade. Isso não é tão novidade. Estar fora das fronteiras dos papéis de gênero e sexo convencionais sempre foi visto como sinal de fraqueza e vulnerabilidade. O que vemos aqui é uma caracterização imposta implementada oficialmente como regulação do status do homossexual.
O Canadá agora parece ser o salvador progressista de um povo violentamente oprimido. Esse é o espírito destilado do humanitarismo. Ele prega uma mensagem de universalismo e neutralidade, mas está longe de sê-lo. Os governantes que têm autoridade para estabelecer as regras do jogo, monitorar, inspecionar, escrutinizar e processar as declarações de “sofrimento” sempre acabam impedindo aquilo que afirmam ser seu objetivo. Acabam impondo um sofrimento ainda maior. A democracia ocidental sempre aparece montada num cavalo branco pregando igualdade, desde que você se comporte. O resultado é um reforço dos velhos preconceitos, que são incorporados aos manuais humanitários atuais.
O pretenso ato de benevolência do governo canadense é uma demonstração brutal do poder do estado ocidental. As portas do Canadá e de outros países ocidentais se abrem, mas apenas temporariamente, para uma pequena minoria, e apenas se responderem adequadamente. É hora de acabar com esse legado de imperialismo humanitário que levou a Síria à presente crise. A única forma de deixar de agir como os selecionadores de quem tem direito à paz e à democracia é derrubando os portões, queimando os livros regulatórios e começando a aceitar um mundo em que todos tenham direito de se movimentar como desejarem. Aqueles que não se encaixam nos padrões convencionais de sexualidade no Oriente Médio encaram grandes perigos, mas não devemos submetê-los aos nossos padrões antes que permitamos sua entrada em nossas comunidades. Todos devem poder explorar e se assentar onde desejarem. Ou os governos acabam com sua burocracia ou eles devem passar a nos poupar de suas declarações vazias de humanitarismo.
Traduzido por Erick Vasconcelos.