Em um artigo para o New York Times (“Invitation to a Dialogue: Alternative Therapies”, 14 de maio), o médico James S. Gordon escreve:
“Muitos economistas acreditam que os custos dos planos de saúde devem continuar a subir. O que é ainda mais alarmante é que o Affordable Care Act provavelmente reforçará a prática corrente, que obriga a execução de intervenções cirúrgicas e farmacológicas que sejam caras, inapropriadas, carregadas de efeitos colaterais e, frequentemente, inefetivas.”
Além disso, o Affordable Care Act é somente o último de uma sequência de regulamentos aprovados ao longo do último século que visam ostensivamente aumentar o acesso a serviços de saúde, mas que, por conta dos subsídios dispensados pelo governo, ficam presos a um status quo que requer diversos tratamentos caros, limitando as inovações de baixo custo na medicina defendidas pelo Dr. Gordon. Como observou Ivan Illich no livro Medical Nemesis, em 1975:
“As impressionantes tecnologias médicas em conjunto com uma retórica igualitarista criam a impressão de que a medicina contemporânea seja altamente eficaz. E não há dúvidas de que, na última geração, alguns procedimentos específicos se tornaram extremamente úteis. Mas quando estes não são monopolizados pelos profissionais da área como ferramentas de trabalho, os que são aplicáveis muitas doenças são, geralmente, muito baratos e requerem poucas habilidades pessoais, materiais e serviços dos hospitais. Por outro lado, a maior parte do aumento dos custos de serviços médicos atuais se destina a métodos de diagnóstico e tratamento cuja eficácia é, no máximo, duvidosa.”
Esse será o resultado inevitável enquanto forem favorecidos os modelos de investimento intensivo de capital e de produção em massa de serviços uniformes a pacientes passivos defendidos pela elite profissional — bête noire de todo o trabalho de Illich, em saúde, educação ou energia. Presume-se que esses modelos sejam necessários para garantir os padrões de qualidade moderno. Não são. No livro Neighborhood Power, do mesmo ano, David Morris e Karl Hess observavam: “Somos muito dependentes de especialistas externos quando somos ignorantes — e somos extremamente ignorantes a respeito de nossos próprios corpos. Até nossos carros são mais abertos ao conhecimento comum do que nossos corpos”. Ao pesquisarem sobre formas mais simples de cuidados de saúde, Morris e Hess concluem: “Certamente tais serviços não precisariam ser executados por médicos formados”.
O historiador David T. Beito, ao resumir sua extensa pesquisa sobre a medicina de alojamentos, que fornecia serviços de saúde a baixo custo no começo do século 20 nos Estados Unidos a milhões de membros de fraternidades antes que o modelo fosse deliberadamente suprimido, observa que ela “abria raras oportunidades para os trabalhadores americanos para fazer comparações e experimentos, dando a eles o poder econômico para se livrar da visão limitadora de que a saúde era um bem genérico”.
A efemeridade das tecnologias no século 21 pode ressuscitar o modelo cooperativo da medicina de alojamentos, sem fins lucrativos e sem burocracia. Assim como as fazendas urbanas e a energia solar de Morris e Hess, com o aumento paulatino dos efeitos perversos do modelo atual, que se tornarão grandes demais para que ele não seja abandonado, os sucessos isolados como o da Ithaca Health Alliance poderiam deixar de ser exceções e passar a serem essenciais na sociedade pós-industrial.
Traduzido do inglês para o português por Erick Vasconcelos.