Logo após a publicação de meu recente artigo “Se isso é seu, venha pegar“, fiquei sabendo por uma matéria publicada no Boing Boing por Cory Doctorow que a General Motors (GM) também declarou que você não é realmente dono daquilo que compra.
Para ser mais claro, o software utilizado no veículo é meramente “licenciado” para o dono do carro. Isso foi afirmado diretamente pelo advogado da GM Harry Lightsey que afirmou: “É nossa posição que o software no veículo é licenciado pelo seu dono (…)”.
Os comentários de Lightsey foram feitos em uma audiência no Escritório de Direitos Autorais dos Estados Unidos que discutia se mecânicos independentes têm a permissão para consertar carros por conta própria. Os resultados de um sistema dessa natureza parecem claros. Primeiro, seria mais fácil elevar os preços graças aos monopólios artificiais da GM. Segundo, haveria menos inovação nesses programas porque os códigos seriam fechados. Tudo isso parece muito promissor para o consumidor, certo?
Mas você não precisa nem ir tão longe para perceber o quão pouco a GM se importa com o consumidor. Um sinal claro disso pode ser encontrado em seu uso da propriedade intelectual para “defender” o que é “seu”. A propriedade intelectual é um conceito bastante caro que fecha muito mais portas do que abre. Ela cria movimentos de cercamento artificial em torno de coisas que normalmente não seriam tão escassas.
Assim, a GM, como a John Deere e outras empresas que dependem da propriedade intelectual para seus lucros, continuam a ser os melhores exemplos de como o capitalismo é contrário às forças do livre mercado.
Mas caso você esteja curioso para saber qual é o lado da GM, Katie Cox, do site Consumerist, fez para nós um resumão do argumento da GM:
Os carros funcionam porque o software diz para os componentes como operar;
O software que diz para os componentes como operar é um código personalizado;
Esse código está sujeito à proteção dos direitos autorais;
A GM é dona dos direitos autorais sobre o código e sobre o software;
Um carro moderno não pode rodar sem esse software, sendo integral a todos os seus sistemas;
Portanto, a compra ou o uso do carro é um acordo de licenciamento;
E, uma vez que se trata de um acordo de licenciamento, a GM é a dona e pode permitir ou não o uso e o acesso ao carro de maneiras específicas.
Bem, o que torna esses “direitos autorais” legítimos, de qualquer maneira? O que torna a GM a legítima dona do seu carro? Como o acordo de licenciamento naturalmente se segue da integralidade do software ao funcionamento do carro? Um título de propriedade sobre o carro não se sobrepõe a qualquer acordo de licenciamento? Os carros serão redutíveis ao código que auxilia em seu funcionamento no futuro?
Minha última preocupação é ecoada pelo jornalista de videogames Jim Sterling, que, em um de seus vídeos, observa: “É realmente irônico. O conteúdo digital não envelhece. Ele é perfeito para a preservação dos videogames. E, no entanto, o conteúdo digital é o mais frágil. O menos permanente”.
Da mesma forma, se o que era nosso for reduzido a seus componentes digitais, como poderemos evitar essa fragilidade?
A resposta está no anarquismo.
Com ele, podemos destruir os privilégios e as corporações que se beneficiam do protecionismo intelectual garantido pelo estado. Nós podemos iniciar esse processo estimulando hackers, mecânicos independentes e a ética do faça-você-mesmo dentro de nossa cultura. Nosso objetivo final deve ser o de criar redes e movimentos fluidos e dinâmicos que podem efetiva e consistentemente perseguir, sabotar e driblar os danos causados pelas grandes corporações e pelo estado.
A GM ousa ser estúpida, mas nós podemos ousar ser anarquistas.
Traduzido por Erick Vasconcelos.